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Medida socioeducativa garante novas perspectivas de vida para adolescentes em SG

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Publicado em:  27/05/2019

“Ajudar a família e ganhar dinheiro”, essa foi a resposta de mais de 60% de adolescentes e jovens do Estado do Rio de Janeiro quando perguntado o motivo do ingresso no que é considerado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) uma das piores formas de trabalho infantil: o tráfico de drogas. Na pesquisa feita pelo Observatório das Favelas, destes, 34% compõem a Região Metropolitana. Em São Gonçalo, cerca de 100 adolescentes, mais de 50% dos que hoje realizam o cumprimento de medida socioeducativa em liberdade assistida, também passaram pelo tráfico de drogas. Meninos, em sua maioria, entre 13 e 18 anos, negros, oriundos de favelas e regiões periféricas, com pouco ou nenhum acesso a políticas públicas.

No programa de medida socioeducativa, realizado através dos Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas), mais do que mudar essas estatísticas, cada um deles deseja mudar a própria vida.

“Quando meu filho chegou aqui, ele era outra pessoa. Estar com outros adolescentes que passaram por situações semelhantes a dele e poder conversar mudou muito a cabeça dele. Tem coisas que os filhos não abrem para os pais, mas entre eles se escutam, e estando em um lugar que vai apontar outros caminhos de forma positiva, ele vê que não está sozinho!”, disse L., de 31 anos. Mãe de um adolescente de 16 anos que realiza a medida socioeducativa no Creas Vista Alegre, um dos que possuem o maior número de adolescentes em cumprimento (51).

Ela o acompanha nos encontros e rodas de conversa realizados pela instituição, senta ao lado do adolescente e também participa das atividades. Quando entrevistada, a mãe acompanhava o filho em uma palestra sobre Infecções sexualmente transmissíveis (IST) e Abuso e exploração sexual. Os encontros são mensais, com variados temas e acontecem nos cinco Creas, ligados a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, espalhados pelo município nos bairros: Arsenal, Luiz Caçador, Mutondo, Vista Alegre e Jardim Catarina.

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), um jovem em conflito com a lei só deve ser privado da liberdade quando cometer ato infracional mediante grave ameaça ou violência à pessoa; reincidir em infrações graves ou descumprir “reiterada e injustificavelmente” medidas impostas anteriormente. A medida socioeducativa na modalidade de liberdade assistida garante o acompanhamento pedagógico e a contínua convivência do adolescente junto à família e à comunidade. Trata-se de uma intervenção educativa, que tem como objetivo reorientar o jovem e possibilitar novos caminhos e escolhas. É o que também acredita Fellipe Souza, coordenador e psicólogo do Creas Vista Alegre.

“Aqui nós podemos trocar ideias sobre novas experiências e possibilidades. Muitos quando chegam, acreditam que só há um caminho e uma forma de ser. Aqui mostramos que criar e buscar novas trajetórias é possível. Por isso os encontros são tão importantes, porque eles conversam, trocam, se identificam. O exemplo do outro que é como ele é muito importante. Tanto para eles quanto para as famílias, que os acompanham, se preocupam!”, afirma.

Ao chegar no CREAS, encaminhados pelo Juizado da Infância e da Juventude, o adolescente e sua família são inseridos no serviço de Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI), que realiza estudo de caso sobre as condições de vida e a dinâmica familiar. O acompanhamento contempla o sistema de Garantia de Direitos que engloba o Sistema único de Saúde (SUS), Sistema único de Assistência Social (SUAS), Sistema de Justiça e Segurança Pública e Sistema de Educação. Eles são encaminhados para o retorno à escola, realizam palestras e cursos profissionalizantes, e são acompanhados por uma equipe multidisciplinar formada por assistentes sociais, psicólogos e educadores sociais.

O que aponta a pesquisa mencionada no início do texto traz inúmeros desdobramentos. Um deles, foi norteado pela ONG da cidade de Niterói, Bem Tv (em parceria com a Universidade Federal do Rio de janeiro – UFRJ), que constatou que quase metade da juventude negra em São Gonçalo (34,7%) está desempregada, começa a trabalhar mais cedo e tem menor escolaridade. Entretanto, a busca por ajudar a família ou aumentar a renda pode encontrar caminhos errados, nunca fáceis como pensa o senso comum. Para Maria Motta, coordenadora do programa de medida socioeducativa de São Gonçalo, para mudar a história é preciso que as políticas públicas alcancem esses jovens e que o senso de responsabilização, não de culpa, é o caminho.

“O objetivo é levar o adolescente à reflexão e ao reconhecimento de sua responsabilidade frente ao ato infracional. Portanto, responsabilizar não significa punir, constranger, reprimir ou humilhar o adolescente. A responsabilização deve ser suscitada por meio de intervenções técnicas e inserção do adolescente em atividades e/ou serviços que promovam a reflexão sobre a convicção que o leva à opção pela trajetória infracional. Assim, o processo de responsabilização aliado à proteção social permitirá o comprometimento do adolescente com sua escolarização, sua saúde, estabelecimento de novos vínculos, adesão às oportunidades ofertadas a ele de profissionalização, inserção no mercado de trabalho e de acesso a bens e equipamentos culturais!”, afirmou.

De janeiro de 2018 a abril de 2019, mais de 200 adolescentes passaram pelos Creas em São Gonçalo no cumprimento de medida socioeducativa em liberdade assistida e prestação de serviço comunitário (PSC). Cada encontro e atividade, planejados e estruturados pelas equipes técnicas, tem como objetivo transformar as trajetórias de cada um deles.

“Se tem uma palavra que eu posso resumir o que é o programa de medida socioeducativa é possibilidade. Sem negar a sua história e dores, estimulamos os adolescentes a refletirem sobre suas próprias trajetórias e o seu poder em mudá-las!”, afirmou a subsecretária de Proteção Social Especial (PSE), Mariângela Valviesse.

Para a secretária de Desenvolvimento Social, Marta Maria Figueiredo, mudar a própria trajetória passa por se ver como imagem positiva para si mesmo e para aqueles que os acompanham ao longo da vida.

“Restabelecer a autoestima é um dos pontos fundamentais durante o percurso do/a adolescente no programa de medida. Fazer com que eles acreditem em si mesmos e se vejam capazes e protagonistas das suas próprias vidas! Muitos chegam sem referenciais positivos e ao longo dos encontros trabalhamos para que ao fim do cumprimento eles mesmos se vejam como referência para outras pessoas!”, disse.

SERVIÇO

Pesquisa Ong Bem TV: A Incidência do Racismo sobre a Empregabilidade da Juventude em Niterói e São Gonçalo (RJ)
https://www.bemtv.org.br/relatorio-trabalho-juventude/

Pesquisa Observatório das Favelas: Novas Configurações das redes criminosas após a implantação das UPPs
https://bit.ly/2ABmot3

Autor: Thayná Valente
Foto: Lucas Alvarenga

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